Ministro insiste em levar bolsonaristas para o governo Lula e irrita petistas
Os movimentos do ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, na busca de cargos para ex-membros do governo bolsonarista causam estranhamento e descontentamento entre integrantes e aliados do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Também chama a atenção a sua proximidade com o ex-ministro de sua pasta durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), o almirante Bento Albuquerque, que prestigiou a posse de Silveira e já o visitou no ministério. É apontado no setor de energia como uma espécie de conselheiro informal de Silveira.
Mineiro, o ministro é filiado ao PSD de Gilberto Kassab, secretário de Governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos) no estado de São Paulo, e aliado do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). No setor de energia, o que se conta é que ele vem sendo pressionado a ampliar espaço para o PSD e seus aliados no governo, mas tem tido dificuldades.
Na ação mais recente, no final da noite de segunda-feira (27), Silveira impôs a sua lista de indicados para o conselho de administração da Petrobras, gerando críticas dentro da própria empresa e entre os sindicatos aliados do governo. O ministro teria quatro dos oito nomes indicados pela União.
O seu nome para presidir o conselho da companhia é Pietro Mendes, que foi secretário de Bento Albuquerque quando ele era ministro.
A FUP (Federação Única dos Petroleiros) chegou a divulgar uma dura nota questionando as indicações. No texto, o coordenador-geral da entidade, Deyvid Bacelar, diz que são nomes “ligados ao bolsonarismo, ao mercado financeiro e a favor de privatizações”.
Integrante do grupo de transição do novo governo para a área energética, Bacelar questionou em entrevista à Folha a ausência de indicações mais alinhadas com o presidente Lula —seu único nome na lista é o presidente da estatal, Jean Paul Prates.
“Como é que o Lula, o presidente do país, não vai ter nenhum nome no conselho da Petrobras?”, criticou. A elaboração da lista já vinha sendo alvo de embates entre o ministro, petistas e sindicalistas.
A lista gerou desconforto inclusive no entorno de Prates, que se apressou a jogar para o ministro a responsabilidade pelos nomes. Deve ser questionada nos órgãos internos de controle por possíveis conflitos de interesse e pela falta de experiência de alguns dos indicados no setor.
Nesta quarta-feira (1º), o governo reagiu. Anunciou uma mudança na lista de indicados ao conselho e o adiamento da assembleia de acionistas que elegerá o colegiado, sinalizando que fará novas alterações.
Foi incluído na lista o economista Bruno Moretti. Consultor legislativo próximo à bancada petista, ele teve cargos em ministérios durante o governo Dilma Rousseff e assessorou o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, na elaboração de projeto de lei.
Tem posição alinhada ao governo em relação à política de preços dos combustíveis da estatal. Em entrevista à Rádio PT em março de 2022, defendeu que uma Petrobras integrada consegue equilibrar perdas e ganhos entre as áreas de exploração de petróleo e refino.
“Esses agentes privados que não são integrados vão praticar preços maiores”, afirmou, referindo-se a empresas privadas que negociavam refinarias da estatal. De fato, o caso do Amazonas mostra que os preços dispararam após a privatização.
Não foi a primeira vez que o ministro causou esse tipo de desconforto, nem que apoiou nomes ligados a Bento Albuquerque.
Silveira quer Bruno Eustáquio para o cargo de secretário-executivo do MME (Ministério de Minas e Energia). Eustáquio é servidor com mais de uma década de experiência na área de infraestrutura, incluindo energia, óleo e gás. No entanto, ganhou projeção na gestão bolsonarista. Foi secretário adjunto da pasta quando o almirante era ministro e depois secretário-executivo do Ministério de Infraestrutura.
O nome foi vetado pela Casa Civil e pela presidente do PT, Gleisi Hoffmann. Sobre a questão, Gleisi afirmou à Folha que os aliados precisam ter bom senso na hora de escalar cargos de confiança no atual momento político.
Silveira chegou a recorrer a Lula na tentativa de emplacar o seu escolhido, mas nem assim conseguiu garantir a liberação. Passados dois meses desde o início do novo governo, Silveira ainda não nomeou o seu secretário-executivo. A leitura no setor de energia é que ele mantém o compasso de espera nessa questão enquanto reforça a ofensiva por cargos agora nas estatais.
Chamam a atenção também os movimentos envolvendo Itaipu e, por tabela, a ENBPar, estatal criada para assumir a usina binacional e Eletronuclear no lugar da Eletrobras após a sua privatização. A ainda desconhecida ENBPar comercializa a energia de Itaipu.
Ambas ainda aguardam os novos gestores e são comandadas por integrantes da Marinha. No posto de diretor-geral de Itaipu está o vice-almirante da Marinha, Anatalicio Risden Junior. O vice-almirante Ney Zanella preside a ENBPar,
A escolha do comando de Itaipu é uma prerrogativa do presidente da República. Mas o rito oficial prevê que o nome seja encaminhado pelo MME para a ENBPar, que por sua vez, o envia para a análise do conselho de administração de Itaipu, que pode ser convocado a qualquer momento.
No final de janeiro, Lula escolheu o deputado Ênio Verri para o posto. Mas o trâmite burocrático tem sido mais lento que o normal, segundo fontes do setor. A expectativa é que a posse ocorra apenas na segunda quinzena de março.
Com essa demora, a gestão bolsonarista acabou tendo o privilégio de promover o ato que marcou o pagamento da última parcela da dívida contraída nos anos de 1980 para a construção da usina, que ocorre neste mês. Silveira confirmou presença no evento marcado para terça-feira (28) e convidou Verri para acompanhá-lo. Ficou agendado que ambos viajariam juntos às 7h daquele dia para a celebração.
Pessoas que acompanham a rotina em Itaipu enxergaram o gesto de Silveira como um duplo ato simbólico. Prestigiar Risden, que é ligado a Bento Albuquerque, e mostrar a sua boa vontade para com o novo governo, e, ao mesmo tempo, apresentar Verri para que se iniciasse uma transição cordata no comando.
Ocorre que as reuniões pela reoneração dos combustíveis se prolongaram, e Silveira ficou preso em Brasília. Enviou um vídeo para o evento. Verri decidiu não ir. Segundo a Folha apurou, o futuro diretor-geral considerou no mínimo estranho que a gestão bolsonarista tenha ficado com o privilégio de promover o ato histórico.
O que se conta no setor é que Bento trabalha nos bastidores para manter a influência nessas estatais, particularmente para garantir projetos que considera vitais, como a construção da usina de nuclear de Angra 3, que depende de muitos trâmites e cifras elevadas. Assim, reforçou os laços com Silveira em busca de apoio.
Bento Albuquerque, por exemplo, sugeriu a Silveira, e ele aceitou, a ajuda informal de Marisete Dadald, que foi sua secretária-executiva no MME. Há quem diga que ela é o plano B de Silveira, caso de Eustáquio realmente não seja aceito pelo atual governo.
Marisete foi ao ministério em pessoa prestar a colaboração. Esse apoio incomodou executivos do setor de energia e causou constrangimento aos servidores da pasta por ser qualificada como temerária. Ninguém questiona a sua competência, no entanto, ela trabalhou pela privatização da Eletrobras e hoje está no conselho da empresa. Não poderia ter acesso a informações da pasta, que são estratégicas.
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